domingo, 8 de agosto de 2010

O Homem da Bengala


Em homenagem ao Yves Hublet, falecido em 26/07/2010, aos 72 anos, em circunstâncias aparentemente suspeitas[i], escritor e teatrólogo que se tornou conhecido nacionalmente como 'O Homem da Bengala' devido ao episódio com o ex-ministro José Dirceu, queremos publicar novamente o texto por ele escrito às vésperas das eleições de 2006[ii] que nada envelheceu 4 anos depois.
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Em 1894, o oficial francês de origem judaica, Alfred Dreyfus, acusado de espionagem a favor da Alemanha, foi julgado, condenado e deportado. O escritor famoso, Émile Zola, sensibilizou-se com o flagrante do anti-semitismo e a enorme injustiça que se perpetrara contra aquele oficial e escreveu uma carta endereçada ao Presidente da República da França com o título: J´Accuse! (Eu acuso!).

Seu ato mobilizou a opinião pública que exigiu a reconsideração do caso. Dreyfus foi julgado novamente, inocentado e reintegrado. Essa carta e expressão “J´accuse!” passou a ser um símbolo da busca pela Justiça e pela Verdade.

Longe de querer igualar a força e a beleza daquela peça literária, ousarei aqui apenas emprestar o modelo de libelo contra a Vergonha e a Corrupção que avassalam o meu país : o Brasil.

NOTA: Permitimo-nos algumas alterações ao texto original, seja para atualizá-lo, seja para enxugá-lo de detalhes, desnecessários em 2010.

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Eu acuso!...
Os partidos políticos de oposição, notadamente o PSDB e o PFL [hoje DEM] de OMISSOS na busca da Justiça, postergando um pedido de ‘impeachment’ do atual presidente da República – Luis Inácio Lula da Silva - quando, por muito menos acusações, defenestrou-se outro presidente: Fernando Collor de Mello. Disseram os líderes dos partidos, que preferiam tirar Lula através do voto, na eleição de 2006.
Ou tratou-se de um enorme e estúpido erro de avaliação (o que não acredito, visto tratarem-se de "velhas raposas" da política) ou de mais um caso vergonhoso de conivência e conveniência com o estado de podridão institucional perpetrado pelo Partido dos Trabalhadores – PT.
Após ler os argumentos que estes líderes vêm apresentando à Nação, concluo tratar-se mesmo do velho argumento “toma lá, dá cá”, e por terem “o rabo preso”, usando um linguajar popularesco. Pratica-se assim, mais um desserviço à Pátria, pois, senhores políticos, a profilaxia é, não apenas desejável, mas imperiosa, quando um mau maior é detectado num organismo sadio.
No caso em pauta, considero o “governo Lula” como um câncer a corromper e infectar todo o corpo saudável da Nação brasileira.
Este é o perfil em que se encontra hoje o Estado brasileiro: lasso, inerte, indefeso à sanha inescrupulosa da quadrilha em que se transformou (já há vários anos) o Partido dos Trabalhadores-PT.

Eu acuso!...
A OAB – Ordem dos Advogados do Brasil – entidade que congrega a elite jurídica da Nação, de OMISSÃO. Abrigando em seus quadros vários ex-Ministros da Justiça e de Tribunais Superiores, a OAB tinha a obrigação de acompanhar as averiguações das graves denúncias feitas, desde o início do ano passado, por membros atuantes do legislativo, bem como o desenvolvimento das várias CPIs. E, o que ainda é mais grave, não ter dado, em meados de 2006, ocasião propícia para a derrubada do líder maior do PT, o devido acolhimento e prosseguimento ao pedido de impeachment, feito pela Conselheira Dra. Elenice Carille[iii]. Os “estudos” se estenderam até os dias de hoje, incluindo as festas de Natal, Ano Novo, Carnaval, Copa do Mundo, etc., porque ninguém é de ferro! Quem sabe a OAB entre com o pedido de impeachment do Lula às vésperas das eleições, momento completamente inadequado, pois será apresentado ao povo como uma postura oportunista e eleitoreira das elites visando a derrubada do “Grande Líder”.

Eu acuso!...
A CNBB – Comissão Nacional dos Bispos do Brasil –de OMISSÃO. Estes bispos da Igreja Católica Apostólica Romana, quase sempre tão atentos e rígidos no estabelecer e aplicar regras e ordenamentos severos na observância de leis terrenas, canônicas e até das divinas, deixaram escapar a ocasião de, pelo menos, criticar seus fiéis, quando se embrenharem pelas vias tortuosas e abjetas da corrupção.
Isso, sistematicamente, acontecendo já há vários anos, dentro do PT, que a CNBB, não só ajudou a crescer (talvez na tentativa de recriação tropical do SOLIDARIEDADE polonês, menina-dos-olhos do então papa João Paulo II), como estimulou os fiéis a votarem nele.
Alguns ex-amigos do atual presidente – o frei Betto, por exemplo – até escreveram livros após o desencanto com os escândalos do Mensalão, etc., e se desvencilharam dos seus cargos dentro do governo. No seu livro “A Mosca Azul”, o frei dominicano reflete e partilha suas observações de ex-assessor especial do presidente da República e coordenador da mobilização social do programa “Fome Zero”. Ele tenta entender, à luz de vários filósofos antigos e modernos, as condições e fatores que operam mudanças substanciais nos corações e mentes de governantes mal preparados para exercerem o poder. E completa, nas páginas do seu livro:
Um corrupto é o resultado de pequenas infidelidades. Ele não se faz senão através de detalhes que se lhe acumulam na alma: levar vantagem num negócio, apropriar-se de um bem aparentemente insignificante e trair a confiança alheia. Não é o dinheiro que destrói a sua moral. É a ganância, a arrogância, a convicção de que é mais esperto que os demais.

Eu acuso!...
A ABI – Associação Brasileira de Imprensa – que, nos seus áureos tempos de atuação, sob a direção hercúlea do insigne jornalista e político Barbosa Lima Sobrinho, combateu os desmandos da ditadura, também de OMISSÃO.
Em nenhum momento a ABI, como entidade, se manifestou contrária aos desmandos e falcatruas com os quais os dirigentes petistas, sob o comando do seu “Líder Maior”, envolveram a nação brasileira. Enquanto se mantinha alheia e acima deste verdadeiro lodaçal infecto e nauseabundo, muitos jornalistas se incorporavam de corpo, alma e inspiração, às hostes governistas, ora endeusando seus dirigentes, ora denegrindo a honra de seus detratores.
Assim, estes jornalistas, tendo em suas sujas mãos o poder que lhes confere a mídia, escrita e televisiva, não só procuraram minimizar as mais palpáveis acusações de crimes como, num claro conluio para acobertar atividades nefastas de ministros, até ajudaram a disseminar acusações e suspeitas sobre personagens de origem tão humilde quanto a do atual “Líder Maior”.
Alguns o fizeram, convictos da justeza de seus ideais sócio-políticos, defendidos nos tempos de chumbo da ditadura. A estes, aguarda a comiseração e o entendimento da posteridade. Mas, para a grande maioria que vendeu seu saber e técnica ao governo para manter seu status quo, sem sequer atentar para a profundidade do poço em que se debruçava a Nação brasileira, a estes aguarda o opróbrio, a infâmia e a repulsa dos seus pósteros.
A bem da verdade, necessário se faz enaltecer a parte sadia da Imprensa brasileira, defendida por jornalistas que, à imagem de Dom Quixote, investiram suas penas contra os moinhos da prepotência governamental através das suas posturas heróicas, foram afastados de suas posições de liderança apenas por exercitarem o livre arbítrio tão importante no exercício da profissão de jornalista. As empresas que os despediram, mesmo com a desculpa de que teriam sofrido represálias econômicas da parte do governo (exatamente como se comportava a ditadura), estão condenadas ao limbo que acolhe os covardes e coniventes.

Eu acuso!...
A ABL – Academia Brasileira de Letras – por sua ALIENAÇÃO e OMISSÃO frente aos acontecimentos que cobrem de vergonha a Nação brasileira. Abrigados sob a égide da Casa de Machado de Assis, o que deveria ser a nata da intelectualidade no âmbito do beletrismo, os acadêmicos acomodaram-se, confortavelmente instalados nas poltronas macias dos vetustos salões e aquecidos pelas chávenas, servidas, britanicamente, às 17 horas. Saciados em seus apetites gastronômicos e em suas vaidades, desfilam pelos corredores envergando seus verdes fardões engalanados de comendas, e esquecem que, aqui fora, estão seus compatriotas. Famélicos, alguns, rotos e esfarrapados outros, todos indignados e atônitos, uma grande e expressiva parte da sociedade brasileira.
Talvez por terem em seus quadros ex-presidentes da República e atuais senadores em exercício, travestidos de poetas e escritores, se preservem de desagradáveis ilações sobre uma política sórdida e um governo pérfido, podre e incompetente.

Eu acuso!...
A SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - de ALIENAÇÃO e OMISSÃO a respeito dos gravíssimos acontecimentos, alguns perpetrados pelo governo do PT, que enxovalham e amesquinham o Congresso, achincalham e dilaceram as instituições, aviltam e destroem a Ética.
Onde estão os cientistas? Onde estão os sociólogos? Onde estão os filósofos?
A única voz que ainda se ouve é a da filósofa – Marilene Chauí – uma das ideólogas marxistas do Partido dos Trabalhadores. Em entrevista ao jornal Brasil de Fato (edição nº 143/2005)[iv], ela diz, em resposta à pergunta:
– Se este governo [do PT] não é de esquerda e ainda por cima, agrada às elites, por que vêm com essa ofensiva para cima dele [Lula]?
Resposta: - “Ah, mas não são as elites. É o PSDB e o PFL. É uma questão eleitoral.”
–“Mas eles são as elites”.
Resposta: - “Não dêem grandeza política, nem histórica a esta crise. Esta crise é a antecipação da disputa eleitoral. Ponto. Parágrafo. É disso que se trata. O Serra quer ser presidente da República.”
Em outro informativo, este do MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra, de 29/12/2005 retiramos um texto publicado na revista Caros Amigos (11/2005), onde a filósofa analisa:
-"Houve a invenção midiática da crise sob a regência dos partidos de oposição na tentativa de um golpe branco. (...) Não se trata de recusar nenhum deles, mas a crise... ela foi criada num momento que alguns julgaram interessante inventá-la. Um produto midiático que avassalou a sociedade inteira."
É assim que a filósofa Marilene Chauí interpreta a catadupa de corrupção, ignomínia e canalhice que nos agride e envergonha:..."um produto midiático..." ou seja: "inventado" pela mídia – a das elites, é claro!
A tudo isso, os cientistas das áreas de Humanas assistiram, quase impassíveis, impenetráveis em suas couraças acadêmicas. E outros, das áreas de Exatas, até aplaudiram e exaltaram a plantação “espacial” de feijão, como o grande feito científico deste início de século. Salvo honrosas exceções!

Eu acuso!...
A UNE – União Nacional de Estudantes de CÚMPLICES desta verdadeira subversão de valores que se pratica contra o Estado brasileiro. Esta entidade, representando a classe que, outrora, lutou contra a ditadura, pela volta da Democracia e restauração da Liberdade, hoje se prostituiu e se aninha sob os tentáculos imorais do governo federal, recebendo benesses jamais sonhadas, vendeu-se em troca de um “prato de lentilhas”, na expressão bíblica.
De uma agremiação atuante, no campo das liberdades individuais e coletivas, tornou-se participante e conivente com um governo venal – e até mesmo terrorista – posto que usuário das mesmas práticas e arbitrariedades que se usou nas cinzas dos tempos da ditadura militar.

E, finalmente...

Eu acuso!...
O Povo Brasileiro de ASSISTIR, passivo, inerte, estático, apático e, até, resignado, o desenrolar do cipoal de acusações fundamentadas de corrupção e várias outras modalidades de crime, que a Imprensa – livre de peias –, o Ministério Público e até alguns parlamentares dignos vêm fazendo contra o governo federal, representado pelo presidente da República, senhor Luis Inácio "LULA" da Silva, do Partido dos Trabalhadores – PT.
Acusações de tal modo graves, que levaram o digníssimo Procurador Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza, a declarar que “uma verdadeira quadrilha” se abrigou sob o guarda-chuva protetor do governo petista.
Várias – e algumas até defensáveis – são as desculpas para justificar esse estado de inércia que acometeu a sociedade brasileira, frente ao oceano de matéria putrefata produzida por esse governo infame.
Verdadeiras ou não, o certo é que poucas foram as atitudes civilistas de que se pode orgulhar naquele ano de 2005, que marcará a História pátria:
- o protesto, quase solitário, da “vovó radical”, a senhora Maria de Lourdes Negreiros (76 anos), aos brados de FORA LULA numa manifestação contra a presença do presidente em Fortaleza;
- a do Tenente-Brigadeiro Ivan Frota, presidente do Clube de Aeronáutica do Rio de Janeiro, que cancelou um convite já feito ao vice-presidente e Ministro da Defesa José Alencar, por ter este apoiado o deputado José Dirceu, recém cassado por atos atentatórios à dignidade dos cidadãos honrados;
- a da alagoana de 80 anos, cujo nome é desconhecido por ela estar sob proteção da Justiça, ex-empregada doméstica aposentada que filmou, na Ladeira dos Tabajaras-RJ, às suas próprias custas e riscos, cenas de parceria PM/traficantes, que resultaram na prisão de vários facínoras, inclusive PMs;
- a do deputado-federal Fernando Gabeira, do Partido Verde (PV-RJ) que, da tribuna da Câmara afrontou, com palavras duras, o nefasto e corrupto presidente da Casa Legislativa, deputado Severino Cavalcanti (PP-PE), que acabou renunciando.

Claro está que a responsabilidade cívica dos cidadãos deve ser considerada a partir da premissa de que, aos mais instruídos e informados caberá um grau maior.

Espero e confio que nos meses dramáticos que se avizinham, onde certamente se delinearão os horizontes de um novo porvir, os envolvidos neste libelo acusatório possam refletir, superar as inibições e se posicionar, contribuindo com o fortalecimento das instituições e com o restabelecimento da Ética e Decoro, em defesa da Honra, da Dignidade e da Democracia.

Pois, como nos ensinou o impoluto patriota Rui Barbosa:

“A Pátria não é ninguém; são todos...”.

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